A corrupção brasileira está com os dentes de fora – escancarados. Mais às claras, impossível. Agora que existe uma visão cristalina do que ocorre é hora da população apertar o cerco aos políticos e obriga-los a criar os sistemas que podem nos proteger delas mesmos.
Especial da Revista Época apresenta duas matérias reveladoras, que seguem abaixo (clique nos links para visitar os originais no site da revista – para assinantes): Como se desvia dinheiro no Brasil e Como diminuir a corrupção. (leia ainda nossa opinião ainda em 6/12/09: Podemos chamar Corrupção simplesmente de Roubo e os Corruptos de Ladrões, que é o que eles são?
Como se desvia dinheiro no Brasil
Com base na análise de casos recentes, ÉPOCA lista as modalidades de corrupção mais comuns no Brasil – e propõe ideias para diminuir a roubalheira
MARCELO ROCHA
O livro Arte de furtar foi concluído em 1656. Atribuído ao Padre Antônio Vieira (mais tarde essa autoria seria contestada), o documento era endereçado ao rei de Portugal, Dom João IV, um dos primeiros representantes da Casa de Bragança. Com o intuito de alertá-lo sobre os malfeitos de seus súditos no além-mar, a obra lista as diversas maneiras encontradas pelos representantes da coroa portuguesa para desviar dinheiro público na colônia. Uma breve passeada pelos títulos de alguns de seus 70 capítulos mostra como a “arte” já se manifestava e se aperfeiçoava no Brasil do século XVII: “Dos que furtam com unhas invisíveis”, “Dos que furtam com unhas toleradas”, “Dos que furtam com unhas vagarosas”, “Dos que furtam com unhas alugadas”, “Dos que furtam com unhas pacíficas” e até “Dos que furtam com unhas amorosas” são alguns deles.
DENÚNCIA
Uma edição de 1926 do livro Arte de furtar, obra finalizada em 1652 para alertar o rei de Portugal sobre os malfeitos de seus súditos no Brasil Colônia (Foto: Sidinei Lopes )
O livro Arte de furtar é uma amostra de como a discussão sobre a corrupção é antiga no Brasil – e a leitura diária dos jornais atesta que o assunto continua presente. Na semana passada, O Globo publicou que o Departamento Nacional de Obras Contra as Secas, o DNOCS, teve um prejuízo de R$ 312 milhões em contratações irregulares e gestão de pessoal. No dia seguinte, a presidente Dilma Rousseff – que popularizou a expressão “malfeito” durante um encontro com Barack Obama, dizendo que não os toleraria em seu governo – teve de mostrar mais uma vez que dizia a verdade. A partir da reportagem, ela decidiu, em mais um lance de sua bem-vinda “limpeza”, negociar com o PMDB para retirar Elias Fernandes Neto, diretor do DNOCS, da direção do órgão. Na quinta-feira, ele saiu.
Para os governantes
A tolerância do eleitor com os “malfeitos” é muito menor em sociedades democráticas e com imprensa livre
Para o eleitor
Saber como se rouba ajuda na fiscalização dos políticos
Não existe sociedade cuja população seja mais ou menos propensa ao roubo. Uma pesquisa científica feita anos atrás mostrou que, diante de uma situação de dilema ético, cerca de 10% das pessoas agem de acordo com rígidos princípios morais, outros 10% agem de forma a tirar o máximo de vantagem, mas a maioria absoluta, cerca de 80%, se pauta principalmente pela possibilidade de ser apanhada. Esse resultado se repete de forma praticamente idêntica em diferentes nações. Portanto, o que faz diferença no nível de corrupção de cada sociedade não é a ideologia, a religiosidade ou a classe social de origem de seus dirigentes, mas as formas com que suas instituições vigiam e punem os responsáveis.
Quem estuda o tema corrupção sem recalque moralista ou interesse partidário costuma dizer que é impossível medir com precisão o tamanho da roubalheira em cada cidade, Estado ou nação. O que alguns rankings internacionais costumam mostrar nada mais é que a percepção da corrupção, uma ideia tão imprecisa quanto a percepção do medo, da saudade ou do amor. Quem rouba não deixa recibo. Tudo o que se conhece, portanto, não é o que foi efetivamente roubado, mas apenas a fração correspondente ao que foi denunciado, flagrado ou investigado.
Técnicos do governo encarregados do combate à corrupção dizem que, nos últimos anos, os mecanismos de controle avançaram, as investigações se tornaram mais profissionais e os órgãos de fiscalização trabalham mais em parceria. No ano passado, a Controladoria-Geral da União (CGU) apurou desvios que chegam a R$ 1,8 bilhão. A soma é resultado de investigações que envolveram licitações fraudadas, cobranças indevidas de procedimentos do Sistema Único de Saúde (SUS) e verbas que seriam empregadas em atividades esportivas para crianças carentes. Desde 2002, quando a CGU passou a consolidar os números, os desvios somam R$ 7,7 bilhões. Esses valores representam o montante que deve ser cobrado dos responsáveis por essas irregularidades, mas, sabidamente, está longe de ser o montante que foi roubado no Brasil.
Se é muito difícil medir com exatidão quanto se rouba, bem menos complicado é saber como se rouba, como já havia reparado o autor do livro de três séculos atrás. Furtar, de fato, é uma arte. Não no sentido de ser algo louvável, mas no sentido de envolver uma multiplicidade de técnicas. O roubo clássico é o desvio de dinheiro de obras públicas, com fraudes em licitações e superfaturamento de preços. Em tempos recentes, a “arte” se sofisticou, envolvendo operações mais imateriais, como cursos e consultorias – serviços mais difíceis de quantificar em termos monetários. Na reportagem que se segue, ÉPOCA listou sete das modalidades de desvio mais comuns no Brasil atual, exemplificando cada uma com casos recentes denunciados pela imprensa.
No ano passado, a Advocacia-Geral da União (AGU) conseguiu recuperar R$ 330 milhões para os cofres públicos em ações que tramitam na Justiça que envolvem, entre outros, casos de corrupção contra a administração pública. Só em 2011, a AGU entrou com ações que pedem a devolução de R$ 2,3 bilhões. É uma luta que vale a pena. Ao ler sobre corrupção praticamente todos os dias na imprensa, é comum que o cidadão muitas vezes se sinta perdido, confuso, desorientado. O guia a seguir visa mostrar que, de maneira geral, a corrupção não é algo tão complexo e rocambolesco como muitas vezes pode parecer. Como uma carta endereçada ao cidadão brasileiro, da mesma forma que Arte de furtar se dirigia ao rei Dom João IV, o objetivo singelo desse levantamento é mostrar como se rouba no Brasil atual. Sempre tendo em vista que, entre estes cidadãos, está a presidente Dilma Rousseff, tão preocupada com os “malfeitos”.
É o caso mais clássico de usurpação. Por meio de uma licitação dirigida, determinada empresa ganha um contrato com o governo. Às vezes, o preço inicial já sai superestimado. No decorrer do serviço, aditivos encarecem a obra. A fartura, depois, é dividida entre corruptos e corruptores. Como são muitas as obras e não há fiscalização suficiente, o ambiente favorece a atuação da malandragem.
Por recomendação do Tribunal de Contas da União (TCU), os órgãos passaram a contratar empresas supervisoras para acompanhar a aplicação dos recursos. O que seria solução virou problema. Auditores já acharam vários casos de promiscuidade entre quem supervisona e quem faz obras. “Já estamos concluindo que é melhor não ter empresa supervisora. Você só está gastando um dinheiro a mais”, diz Luiz Navarro, secretário executivo da CGU.
Na maioria dos casos, os auditores só conseguem “visualizar” o rombo na prestação final de contas, quando recebem notas fiscais e outros documentos. É tarde. A demora dificulta o rastreamento de desvios, o que afasta a chance de recuperá-los. “Foram precisos mais de dez anos para começar a recuperar recursos de um famoso escândalo de corrupção”, diz o advogado Tércio Tokano, coordenador-geral de Defesa da Probidade da Advocacia-Geral da União. O “famoso escândalo” é o do fórum trabalhista de São Paulo, que envolveu o desvio de R$ 1 bilhão, em valores atuais, e tornou conhecido o ex-juiz Nicolau dos Santos Neto, o Lalau.
TRADIÇÃO
Construção da Ferrovia Oeste- Leste. Descobriu-se que os valores orçados estavam muito acima do que seria necessário (Foto: Joa Souza/Ag. A Tarde)
No início de 2011, denúncias com obras derrubaram a cúpula do Ministério dos Transportes, com desdobramentos no Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) e na Valec, responsável pelas obras ferroviárias. O setor era feudo do PR, partido aliado do Palácio do Planalto. As suspeitas jogavam dúvidas sobre uma série de aditivos em obras de rodovias e ferrovias, todas do Programa de Aceleração do Crescimento.
Aditivos encarecem obras porque incluem providências inexistentes nos projetos básicos. Segundo o próprio governo, os projetos básicos são insuficientes em 90% das obras. A fiscalização identificou vários problemas nos contratos do Dnit e da Valec. Num deles, referente à Ferrovia Oeste-Leste (do litoral baiano ao Tocantins), os valores orçados estavam muito acima do necessário. Em apenas um lote da Oeste-Leste houve um sobrepreço de R$ 35 milhões, mesmo após recomendações do TCU. Ao analisar 17 licitações dos Transportes, auditores constataram prejuízo total de R$ 682 milhões, 13,4% de R$ 5,1 bilhões fiscalizados.
São os que roubam fazendo festa. Estados, municípios e ONGs recebem milhões do governo federal para promover todo tipo de festividade popular. O dinheiro normalmente é liberado para contratar estrutura de palco, equipamentos de som, artistas e material de divulgação. Até foguetório entra no patrocínio. Sem realizar licitação, é comum que a escolha de fornecedores seja pautada por critérios políticos. As contratadas superfaturam os preços de produtos e serviços. E as prestações de contas são fraudadas para acobertar o desvio de recursos. Em alguns casos, há suspeita de que o dinheiro é desviado para os políticos.
Num levantamento recente, com base em convênios firmados pelo Ministério do Turismo, o governo identificou irregularidade em dezenas de contratos com municípios e entidades diversas, inclusive para a realização das tradicionais festas de São João. Já são mais de R$ 13 milhões sendo cobrados de prefeituras. Entre os municípios reprovados, São João da Barra, no Rio de Janeiro, recebeu mais R$ 500 mil para organizar o 6o Circuito Junino. Os responsáveis, segundo a CGU, não apresentaram documentos para comprovar o correto uso de todo o dinheiro.
Em outro levantamento, a CGU mostrou que eram previstas a contratação de 66 bandas para a realização de eventos para festejos juninos em 22 cidades de Pernambuco em 2008. Foram liberados R$ 2,4 milhões. Quando os técnicos receberam a prestação de contas e somaram as notas, identificaram que foram pagos aos artistas R$ 2,3 milhões. Onde foram parar os outros R$ 100 mil? Às vezes, não é possível fazer nem esse tipo de checagem simples, por conta de problemas prosaicos, como a falta de notas fiscais.
BAILE
Festa junina em São João da Barra, Rio de Janeiro, um dos municípios com contas reprovadas. Critérios políticos prevalecem na escolha de fornecedores (Foto: Letícia Pontual/Ag. O Globo )
Outras dificuldades dizem respeito a problemas inerentes aos eventos. Como é possível verificar que os 50 mil panfletos previstos no convênio para a divulgação foram efetivamente impressos? Como saber se foram distribuídos 5 mil ou 50 mil cartazes? Em muitos casos simplesmente não é possível checar. E é aí que os larápios costumam agir.
No fim de 2010, uma denúncia assim derrubou o senador Gim Argello (PTB-DF) da relatoria geral do Orçamento. Havia indícios de que convênios patrocinados por suas emendas estavam recheados de problemas, como superfaturamento e fraudes em prestações de contas.
Em agosto de 2011, o então secretário executivo do Ministério do Turismo, Frederico Costa, e outras 35 pessoas, entre empresários e servidores públicos, foram presos acusados de participar de uma quadrilha que fraudava convênios da pasta. Os recursos deveriam ser aplicados no treinamento em turismo no Amapá. Depois de colher indícios de que pelo menos R$ 4 milhões foram desviados, a Polícia Federal realizou a Operação Voucher. As fraudes, de acordo com as investigações, tinham como pivô o Instituto Brasileiro de Desenvolvimento de Infraestrutura Sustentável (Ibrasi), sediado em São Paulo. Tudo sugere que se trata do típico caso de desvio por meio de simulação de cursos de qualificação profissional. Às vezes, o mero bom-senso pode ser um aliado da investigação: “Chamou a atenção o fato de uma entidade baseada em São Paulo promover treinamento de pessoas no Amazonas”, diz Luiz Navarro, da CGU. “Foi sinal de que alguém a estava usando para algum ilícito.”
A exemplo do que ocorre com os patrocínios para eventos, os convênios para qualificação de pessoal são um drama para os fiscais. Como comprovar que um determinado grupo de pessoas foi, de fato, treinado pela entidade conveniada? Uma forma é agendar entrevistas com os supostos treinados e conversar com os instrutores. Levantam-se dados como horas de treinamento e o conteúdo aprendido em sala de aula. Dos instrutores, é possível perguntar quanto foi recebido de salário e qual foi o material didático usado. Ainda assim, é sempre muito difícil chegar a 100% de certeza sobre a destinação correta dos recursos.
ESTRANHEZA
O ex-secretário executivo do Turismo Frederico Silva Costa, algemado pela PF, em Brasília. Uma quadrilha fraudava os convênios da pasta
(Foto: Sérgio Lima/Folhapress)
O ditado popular diz que o diabo mora nos detalhes. Nas ocasiões em que os técnicos do governo conseguiram rastrear e identificar irregularidades, muitos dos desvios foram constatados nas particularidades do negócio. Num caso, o material didático apresentado na prestação de contas não era exatamente o mesmo que foi distribuído aos alunos. Em outro, a fiscalização encontrou pessoas inscritas em dois cursos realizados simultaneamente, a mais de 1.000 quilômetros de distância. Piora o fato de ter de correr atrás dessas informações depois que toda a estrutura para a realização dos cursos já foi desmobilizada. Além do Turismo, pastas como Esporte e Trabalho – neste caso com recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador – se valem de convênios para a qualificação de pessoal.
É o caso da dilapidação em dose dupla. Primeiro, pelo desvio de dinheiro público; segundo, pelo desvirtuamento do princípio da atividade parlamentar.
Funciona assim: cada deputado ou senador pode incluir até R$ 15 milhões por ano no Orçamento da União. O parlamentar coloca o que quiser. Pode ser a construção de uma ponte, a contratação de uma ONG ou a compra de um equipamento. Assim, considerando quatro anos de mandato, cada um dos 513 deputados pode influenciar no destino de R$ 60 milhões ao longo de uma legislatura. São, portanto, quase R$ 30,8 bilhões potencialmente manipuláveis. No Senado, com 81 parlamentares e mandato de oito anos, o valor total potencialmente sob influência direta da Casa chega a R$ 9,7 bilhões por legislatura. Total do Congresso: R$ 40,5 bilhões. É um dinheiro e tanto para um poder cuja responsabilidade institucional não é gastar, mas fiscalizar o governo e aprovar o Orçamento.
Ao direcionar gastos da União por meio de emendas, parlamentares podem favorecer empresas que financiaram suas campanhas, praticar clientelismo, fazer uso eleitoreiro de obras, entre tantas outras delinquências éticas, políticas e legais. Foi por meio das emendas parlamentares que nasceu, cresceu e floresceu a máfia das sanguessugas, um dos maiores escândalos recentes do país. Em 2006, a PF investigou contratos firmados entre Estados e municípios com uma empresa que atuava no comércio de ambulâncias. A investigação encontrou irregularidades nas licitações, como superfaturamento, e veículos recauchutados entregues como novos. As fraudes somavam mais de R$ 110 milhões. Uma CPI foi instalada no Congresso e apontou o envolvimento de mais de 90 parlamentares nas irregularidades. A comissão pediu a abertura de processo de cassação contra 69 deputados e três senadores. Não deu em nada. E, apesar do escândalo, as emendas parlamentares não deixaram de existir. Pelo contrário, nos oito anos do governo Lula, elas saltaram de R$ 2 milhões para R$ 15 milhões por ano, por parlamentar.
CARONA Ambulância em Sorocaba, São Paulo, que foi alvo da CPI das Sanguessugas. Apesar dos problemas, as emendas cresceram (Foto: Epitácio Pessoa/AE )
Além das brechas para a ladroagem, a possibilidade de alterar o Orçamento por emendas pode servir de instrumento para o governo cooptar parlamentares para sua base de apoio. É o segundo efeito nocivo das emendas. Para viabilizar a liberação dos recursos, deputados e senadores precisam negociar com o Palácio do Planalto. Em tese, ser integrante da base seria uma vantagem. A existência desse balcão possibilita que o governo jogue com a conveniência de brecar ou liberar os recursos dependendo da postura do congressista. É uma distorção completa da função parlamentar.
A perversidade disso está em usar um instrumento normalmente associado a práticas positivas para rapinar, pilhar, subtrair. A parceria com organizações não governamentais é uma forma encontrada pela administração pública para implementar políticas sociais no Brasil com mais agilidade e maior capilaridade. Essas entidades têm uma penetração impensável para os gestores públicos. A parceria, no entanto, muitas vezes mostra-se extremamente frágil. As regras que regem essas entidades são mais flexíveis. Até o final do ano passado, por exemplo, não era preciso fazer licitações para escolher as ONGs que receberiam recursos públicos. É por essas brechas que ocorre a gatunagem.
Somente em 2011, mais de 73 mil entidades repartiram mais de R$ 2,7 bilhões de dinheiro público. O problema é que não há garantia sobre a efetiva aplicação dos recursos. “Nada impede que hoje uma prefeitura faça um convênio com uma ONG para tocar a Educação inteira do município. Ou a Saúde inteira. Ou uma obra”, diz Luiz Navarro, da CGU. “Aí caímos no problema real: quem escolheu a ONG? Por que ela foi escolhida? A quem ela pertence? A gente vê coisas absurdas nas prestações de contas, como ONGs ditas sociais que cuidam até de trânsito.”
QUEM ESCOLHE AS ONGS? O policial João Dias. Ele é dono de ONGs que precisam devolver mais de R$ 3 milhões ao governo, numa crise que resultou na demissão do ministro Orlando Silva (Foto: Sergio Lima/Folhapress)
Em 2011, duas ONGs de Brasília que receberam verbas federais protagonizaram o escândalo que resultou na demissão do ministro Orlando Silva da pasta do Esporte. As entidades pertencem ao policial militar João Dias, acusado de desviar milhões dos cofres públicos entregues a ele para oferecer atividades esportivas para crianças carentes. O Ministério Público cobra de João Dias a devolução de mais de R$ 3 milhões. Ele é acusado de forjar documentos para prestar contas ao ministério. As autoridades apuram o pagamento de propina a políticos, incluindo o ex-ministro e atual governador de Brasília, Agnelo Queiroz (PT).
A vulnerabilidade do sistema começa na escolha das entidades que vão receber os recursos. Como não era preciso fazer licitação, os critérios políticos muitas vezes prevaleciam em detrimento do rigor ou da competência técnica. Uma vez contratada, a ONG tem liberdade para subcontratar e escolher seus fornecedores fazendo apenas uma cotação rudimentar de preços. A enorme pulverização dos recursos dificulta o controle.
Daria para dizer que é a modalidade da moda, talvez a mais contemporânea. Ganhou incontestável notoriedade por ser considerada a fonte primária do mensalão, a distribuição de dinheiro a parlamentares da base aliada do governo Lula em troca de apoio político no Congresso.
No caso do mensalão, o dinheiro público desviado seria proveniente de contratos de publicidade firmados pelo governo com o empresário e publicitário Marcos Valério. Essa foi a conclusão da Polícia Federal. A parcela mais significativa dos recursos, segundo a investigação, saiu dos cofres do Banco do Brasil, de um fundo de publicidade chamado Visanet. Esse Visanet é destinado a ações de maketing do cartão da bandeira Visa. As agências de Valério produziram ações publicitárias, mas a maioria dos valores repassados pelo governo teria servido para abastecer o mensalão. Caberá aos ministros do Supremo Tribunal Federal, em julgamento previsto para este ano, dizer se essa tese procede.
Numa manifestação sobre o caso, o procurador Lucas Furtado, do TCU, disse que o grosso da corrupção migrou de obras para contratos de publicidade, principalmente com as estatais. “Os corruptos migraram de grandes obras públicas para contratos de publicidade porque é mais difícil fiscalizar”, disse. Furtado afirmou que, desde o escândalo de desvio de recursos do Tribunal Regional do Trabalho de São Paulo (o escândalo do juiz Lalau), as grandes obras públicas passaram a ser mais fiscalizadas, coibindo o aparecimento de irregularidades.
ELO
O empresário Marcos Valério. Ele é acusado de ter viabilizado o mensalão por meio de suas agências
(Foto: Beto Barata/AE )
Auditorias do próprio TCU e da CGU têm identificado problemas em ações publicitárias contratadas pelo governo. Em muitos casos já apurados, os editais para escolher as agências de publicidade são feitos para favorecer determinadas empresas. É comum as concorrentes apresentarem preços fictícios nas propostas. Além disso, as agências “vencedoras” subcontratam empresas ligadas a políticos para realizar serviços.
tabela consultorias (Foto: reprodução)
No ano passado, ÉPOCA publicou uma reportagem sobre a contratação de serviços de consultoria pela Fundação Nacional de Saúde (Funasa) no Amapá. O órgão firmou um convênio de R$ 6 milhões com a Associação dos Povos Indígenas do Tumucumaque (Apitu). As investigações da CGU revelaram que pelo menos metade dos recursos foi desviada. A tramoia envolveu serviços de consultoria que simplesmente nunca foram prestados. Das contas da empresa contratada pela ONG para realizar estudos sobre a comunidade indígena, o dinheiro saiu direto para o cofre dos comitês eleitorais do PMDB no Amapá. Simples assim. No fim, a maracutaia acabou servindo para o financiamento de campanhas eleitorais de prefeitos ligados ao partido.
Casos como o do Amapá têm se multiplicado pelos órgãos federais, estaduais e municipais. Como estabelecer o valor justo de uma consultoria? Como comparar as relações de custo-benefício de diferentes consultores? As respostas são sempre subjetivas, terreno perfeito para a bandidagem.
Para começar, serviços de consultoria somente deveriam ser contratados para a execução de atividades que, comprovadamente, não possam ser desempenhadas por servidores permanentes da administração pública. Mas não é bem isso o que se observa. Usa-se o critério de “notória especialização” para justificar a contratação de consultores (pessoas físicas ou jurídicas) sem fazer licitação, outro conceito nada objetivo.
RISCO
Sede de associação indígena sob suspeita no Amapá. As consultorias têm se multiplicado (Foto: Diario do Amapá)
Em muitos casos, as empresas contratadas pertencem a pessoas ligadas ao político que determinou ou influenciou a contratação. O desvio ocorre quando o serviço a ser feito não existe ou, se existe, não é parcial ou totalmente executado. A empresa de consultoria recebe o pagamento, apresenta uma papelada qualquer como se fosse produto de muito estudo e análise e repassa o dinheiro arrecadado a políticos ou agentes públicos envolvidos em sua própria contratação.
Como diminuir a corrupção
Experiências de outros países ensinam que medidas em várias frentes – como cortar o número de nomeações e aumentar a transparência – são eficazes no combate aos desvios de recursos
LEANDRO LOYOLA
DUAS MEDIDAS
Rod Blagojevitch, ex-governador do Estado de Illinois (EUA), e Paulo Maluf, ex-prefeito de São Paulo. Ambos foram acusados de corrupção. Mas, por razões legais e culturais, o destino dos dois políticos foi diferente (Foto: Frank Polich/Reuters e Anderson Schneider/Ed. Globo)
Em 2001, o Ministério Público paulista começou a investigar indícios de que o ex-prefeito Paulo Maluf desviara dinheiro das construções da Avenida Águas Espraiadas e do Túnel Ayrton Senna. Em uma década, os promotores ouviram dezenas de envolvidos, viajaram inúmeras vezes para o exterior e desvendaram uma rede de laranjas até encontrar os recursos da prefeitura de São Paulo em contas nas Ilhas Jersey, nos Estados Unidos e na Suíça. Maluf é acusado de ter se beneficiado de um esquema que desviou US$ 200 milhões. A apuração produziu cerca de 55 mil documentos divididos em 277 volumes, material que enche um caminhão.
Em fevereiro, a Justiça de Jersey, um paraíso fiscal no Canal da Mancha, vai decidir se devolve à prefeitura US$ 22 milhões depositados em contas que aparecem em nome de Maluf. Essa devolução seria, do ponto de vista simbólico, uma enorme vitória da luta contra a corrupção. Na maioria avassaladora das denúncias de desvios, o dinheiro nunca volta. Isso acontece porque o país ainda precisa aperfeiçoar as instituições encarregadas de combater a corrupção. Algumas ideias com base em experiências de outros países.
1 – TORNAR A JUSTIÇA MAIS ÁGIL PARA PUNIR OS CORRUPTOS
No mês passado, Rod Blagojevitch, ex-governador do Estado americano de Illinois, foi condenado a 14 anos de prisão. Blagojevitch já está preso há três anos. Ele foi considerado culpado em 18 acusações de corrupção. A mais conhecida é ter tentado vender a vaga ao Senado que fora deixada por Barack Obama ao ser eleito presidente, em 2008. Uma das provas era uma gravação em que Blagojevitch falava na venda da cadeira. A Justiça americana não questionou a legalidade da gravação.
O azar de Blagojevitch foi ser político nos Estados Unidos. No Brasil, seus advogados alegariam que a gravação foi feita sem autorização judicial. Mesmo se tivesse sido feita com autorização, ela ainda poderia ser contestada em tribunais superiores. No ano passado, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) anulou quase todas as provas da Operação Castelo de Areia baseado em detalhes assim. Na investigação, a Polícia Federal (PF) havia reunido provas do envolvimento de políticos, de crimes financeiros e lavagem de dinheiro em operações da construtora Camargo Corrêa.
No Brasil, Blagojevitch também dificilmente seria preso porque alegaria estar no exercício do cargo. O único na história brasileira a ser punido no exercício do cargo foi José Roberto Arruda, do Distrito Federal, em 2010. Mesmo assim, Arruda passou poucos dias preso e responde em liberdade. Compare: só em Illinois, Blagojevitch é o segundo governador preso por corrupção.
Outra diferença é que lá ninguém achou relevante contestar o fato de Blagojevitch aparecer algemado. Aqui, seus advogados moveriam ações que provocariam as mais variadas discussões em tribunais superiores.
Pensar em como Blagojevitch seria tratado em tribunais brasileiros ajuda a entender as causas da corrupção. A Justiça americana aceita indícios fortes como suficientes para condenar alguém. Para a Justiça brasileira, muitas vezes nem imagens ou gravações são suficientes. Parece óbvio que a impunidade acabe servindo de incentivo para a corrupção.
Particularidades do Judiciário brasileiro tornam muito difícil prender um corrupto. “Corrupção é difícil de provar em qualquer lugar”, diz Cláudio Weber Abramo, da Transparência Brasil. “Mas o sistema brasileiro é menos eficiente.” A legislação brasileira oferece uma infinidade de recursos para atrasar os processos. Também há complicações para o uso da delação premiada, em que um dos réus pode ser beneficiado se colaborar nas investigações. Estados Unidos e Itália usam largamente esse recurso.
Para punir mais os corruptos é preciso mais critério desde o início. Hoje, mais de 70% dos inquéritos da PF têm falhas que impedem o Ministério Público de iniciar ações judiciais. Os inquéritos policiais teriam de ser mais bem feitos para gerar provas contundentes. É preciso também uma ampla reforma, capaz de reduzir o número de recursos e de instâncias judiciais. Hoje, um réu pode usar 37 tipos de recurso para recorrer em quatro instâncias – o que os corruptos, em geral, conseguem fazer com o auxílio de advogados competentes.
Blagojevitch foi preso rapidamente, julgado e condenado em três anos. No Brasil, isso seria praticamente impossível. Como governador ou parlamentar, ele teria direito a foro privilegiado. Seu julgamento seria no Superior Tribunal de Justiça e terminaria no Supremo Tribunal Federal (STF). Atualmente, 115 deputados e 22 senadores estão enrolados em ações ou processos no STF. Como tem apenas 11 ministros e uma estrutura que não foi preparada para isso, o Supremo demora para julgar os políticos.
2 – DIMINUIR O NÚMERO DE NOMEAÇÕES
Hoje, cerca de 24 mil cargos na administração direta da União e nas estatais podem ser ocupados por gente que não prestou concurso. O critério para o preenchimento de muitos desses postos não é a especialização ou a competência técnica, mas a afinidade partidária e o compadrio. A história mostra que, em geral, não são nobres as motivações dos políticos que fazem tanto esforço para indicar seus conhecidos para cargos públicos. A solução é reduzir o número de vagas que podem ser preenchidas assim.
O presidente do Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), Antonio Gustavo Rodrigues, está acostumado a rastrear movimentações financeiras atípicas. Muitas delas são resultado de desvios de recursos públicos. Rodrigues diz que a redução desses cargos seria um poderoso mecanismo de combate à roubalheira. “Ter apenas servidores concursados não evita, mas certamente diminui a corrupção”, diz.
Mexer com isso é afrontar uma tradição da política brasileira. Nenhum candidato à Presidência prometeu ou tentou reduzir o número de cargos à disposição dos políticos. O absurdo do sistema fica evidente quando comparado com as regras em outras democracias. A França, um dos países que mais valorizam o funcionalismo público, reserva apenas 500 vagas para indicações. O Reino Unido permite 300 indicações. E, mesmo assim, os escolhidos têm de comprovar capacidade técnica. O país mais restrito é a Alemanha, onde há apenas 170 cargos para indicações políticas.
O caso dos Estados Unidos é especialmente interessante. Dono de uma das maiores administrações públicas do mundo em termos absolutos, o país tem apenas 4.500 cargos que podem ser preenchidos por indicação política. No século XIX, a administração americana era loteada despudoradamente pelo partido vencedor. A situação começou a mudar em 1883, com o Civil Service Act, a primeira lei de profissionalização da administração pública. Várias reformas foram feitas para aperfeiçoar o sistema, a última em 1978, no governo de Jimmy Carter. Desde 1952, o Senado americano publica a lista dos escolhidos pelo presidente para esses cargos. O Plum Book (Livro Ameixa), como é conhecida a lista, virou uma tradição.
3 – AUMENTAR O PODER E A ESPECIALIZAÇÃO DOS ÓRGÃOS FISCALIZADORES
Do ponto de vista formal, o Brasil possui estrutura institucional adequada para prevenir e combater a corrupção. O Ministério Público e a PF dispõem de poderes para investigar, o Tribunal de Contas da União (TCU) fiscaliza os gastos do governo federal, o Coaf monitora movimentações financeiras atípicas e a Controladoria-Geral da União (CGU) fiscaliza licitações, contratos e convênios, além de planejar a prevenção. “O Brasil está bem aparelhado na esfera federal”, diz Cláudio Weber Abramo, da Transparência Brasil. “Falta ampliar para Estados e municípios, onde os controles são muito fracos.” Se, apesar dessa estrutura, o governo federal é tão suscetível, imagine os Estados e municípios, cujos controles são muito mais frouxos.
Responsáveis por fiscalizar prefeitos e governadores, os Tribunais de Contas dos Estados são controlados politicamente. Nas esferas estadual e municipal, não há órgãos como a CGU. Com isso, os Ministérios Públicos estaduais acabam sendo os únicos encarregados do trabalho.
A pressão da sociedade é fundamental para que a lei de transparência funcione
Outra limitação é que o Brasil investiga corrupção como se fosse só mais um crime no rol de dezenas de delitos. É diferente do que ocorre em países como a Itália, que possui estrutura de investigação voltada exclusivamente para rastrear a corrupção no Estado. Para combater a infiltração da Máfia no governo, os italianos criaram uma estrutura em que polícia, Ministério Público e Justiça trabalham juntos para investigar, produzir provas e julgar. A especialização é incipiente no Brasil. A PF está passando por reformas internas para tentar se adequar. Em breve, suas superintendências terão delegacias especializadas em investigações de desvios. Hoje, os casos são investigados por diversas áreas, de acordo com os crimes apontados.
As instituições também precisariam ser mais voltadas para a prevenção. Os técnicos da CGU estudam os procedimentos de ministérios e órgãos e recomendam mudanças, mas o órgão carece de autoridade. Ela não pode ordenar diretamente a um ministério que mude seus procedimentos. Precisa pedir à Presidência que formule um decreto.
4 – GARANTIR O FUNCIONAMENTO EFETIVO DA LEI DE ACESSO À INFORMAÇÃO
Tornar o Poder Público realmente público é fundamental para reduzir a corrupção. No ano passado, o Congresso aprovou a Lei de Acesso à Informação. O maior avanço é abrir a máquina pública ao cidadão que a sustenta. A lei obriga os governos a divulgar dados da administração na internet. Cria regras para o fornecimento de qualquer informação pedida. Por último, disciplina a prática de estabelecer o grau de sigilo de documentos e o acesso a eles.
Não é pouco. Se uma prefeitura decidir aumentar o valor pago a determinada empreiteira pelo asfalto de uma rua, terá de publicar o aditivo na internet. Assim, qualquer interessado terá acesso fácil à informação, seja ele opositor do prefeito, fornecedor da empresa, trabalhador, concorrente ou mero curioso.
Um dos avanços na lei é estabelecer mecanismos para evitar que as perguntas dos cidadãos caiam no vazio. A lei prevê que, se o governo se recusar a fornecer a informação, o cidadão poderá recorrer e uma comissão avaliará o caso.
Grande parte dos países democráticos tem suas leis de acesso. Em todos eles há dificuldades. A mais comum é o atraso para responder às solicitações. Há entidades que defendem esse direito e se especializam em pressionar os governos por acesso cada vez maior a documentos públicos. Nos Estados Unidos, a National Security Archive é especializada em usar mecanismos da lei local para tornar públicos documentos secretos do governo. Já conseguiu liberar papéis fundamentais para a história, guardados especialmente pelo Departamento de Estado e pela Agência Central de Inteligência. Por motivos óbvios, a CIA é um dos órgãos que criam mais dificuldades para a lei.
Na Inglaterra, a imprensa conseguiu forçar o governo a liberar documentos sobre a guerra ao terrorismo. Conquistas assim são resultado de pressão. Pela lei, o governo brasileiro tem até maio para criar condições para começar a cumpri-la. Nessa hora, a pressão social é fundamental.
Artigos relacionados:
gostei muito do seu site parabéns. I like so much your
website, verygood content. i will follow you
your website is very good, congratulations on the content.
very good the site I liked it
Aqui é a Solange De Oliveira, gostei muito do seu artigo
tem muito conteúdo de valor, parabéns nota 10.
Visite meu site lá tem muito conteúdo, que vai lhe ajudar.
Aqui é a Bianca De Oliveira, gostei muito do seu artigo tem
muito conteúdo de valor, parabéns nota 10.
Visite meu site lá tem muito conteúdo, que vai lhe ajudar.
Parabéns pelo site!
ótimo conteúdo.
Desejo-lhes sucesso.
multi ferramentas de marketing digital Gratis
Trabalhe com Software Divulgar mais de 240 classificados
gratis ,Software Facebook Marketing Grupos , Software
Promover Sites e Blogs Marketing, Ferramentas Gratuita
Para Download Gratis , e muito mais sistemas .
otima oportunidade de negócios não percam !!
Demo Gratuito Para Download Gratis
Copie e Cole no Navegador : https://bit.ly/34ScGRn
Contato :
Skype: MktMidia
alcance seu publico negocios marketing de sucesso
Aqui é a Fernanda Lima , gostei muito do seu artigo tem
muito conteúdo de valor parabéns nota 10 gostei muito.
It sounds like you would meet that definition and viagra before pharmacy may be useful for you.
Incidentally I have been ordering top ten personal loan lenders and Cialis not for the first month.
Small business owners for another loan generic cialis Pill Cialis Pill transaction face this plan.
Average dose for viagra , cialis online pharmacy wait time .
Last treatment for both were also assured assured assured of can you get erectile dysfunction on the nhs.